Por Flavio Meireles
O senador Welinton Fagundes (PL-MT) levou ao plenário do Senado uma denúncia que promete reacender a disputa entre produtores rurais, ambientalistas e setores da cadeia exportadora: a moratória da soja, acordo firmado em 2006 entre empresas do agronegócio e organizações ambientais para impedir a comercialização de grãos cultivados em áreas desmatadas da Amazônia após 2008. Para o parlamentar, a moratória — que já passou por prorrogações sucessivas — “virou instrumento de imposição ideológica e de chantagem comercial contra o Brasil”.
Segundo Fagundes, o mecanismo estaria sendo utilizado por tradings internacionais para manter o país sob vigilância e restringir a competitividade da produção nacional. “Quem dita as regras não são os agricultores brasileiros, mas empresas estrangeiras que se aproveitam do nosso potencial para impor barreiras disfarçadas de sustentabilidade”, afirmou. Ele defende que o Código Florestal de 2012 já garante proteção suficiente e que não há justificativa para manter uma política paralela que, em sua visão, “criminaliza o produtor rural”.
A denúncia ocorre num momento em que a União Europeia avança com sua lei de rastreabilidade ambiental, que proíbe a entrada de produtos ligados ao desmatamento. Para Fagundes, a moratória da soja seria “a semente dessa legislação punitiva”, hoje vista por parte do Congresso como uma forma de protecionismo verde. “Eles não querem nossa soja, querem nos impedir de crescer e competir”, disse o senador.
A reação no setor produtivo foi imediata. Associações de produtores de Mato Grosso e de outros estados do Centro-Oeste aplaudiram a fala, alegando que a moratória, ao invés de incentivar boas práticas, cria burocracia e eleva os custos de produção. Para a Aprosoja, a manutenção do acordo “fere a soberania nacional” e não encontra paralelo em nenhum outro grande produtor agrícola do mundo.
Por outro lado, entidades ambientalistas reagiram com críticas duras. O Greenpeace, uma das organizações que assinaram o pacto inicial em 2006, afirmou que o mecanismo foi decisivo para reduzir o desmatamento da Amazônia e dar credibilidade internacional à soja brasileira. “Sem a moratória, dificilmente o Brasil teria conseguido abrir mercados na Europa e conquistar a confiança de investidores”, destacou em nota.

No Congresso, a denúncia de Fagundes dividiu opiniões. Parlamentares da bancada ruralista reforçaram o coro pela revisão ou extinção do acordo, enquanto senadores ligados à pauta ambiental lembraram que a moratória se consolidou como um modelo de autorregulação de mercado reconhecido mundialmente.
A pressão também chega ao Executivo. O Ministério da Agricultura, que nos últimos anos manteve posição neutra, agora se vê cobrado a se posicionar diante das acusações de ingerência externa. Técnicos da pasta avaliam que a moratória pode perder sentido diante da nova legislação europeia, mas ponderam que o Brasil não pode arriscar perder mercados bilionários por uma ruptura unilateral.
Para especialistas em comércio internacional, o debate sobre a moratória da soja expõe o dilema central do agronegócio brasileiro: conciliar expansão produtiva com credibilidade ambiental. “O Brasil é o único país que consegue aumentar a produção sem precisar abrir novas áreas. Mas se romper acordos que o mundo vê como símbolo de sustentabilidade, pode sofrer retaliações comerciais severas”, avaliou um consultor ligado à Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA).
A denúncia de Fagundes, portanto, não é apenas um gesto retórico: pode abrir caminho para uma ofensiva legislativa contra o acordo, pressionando as tradings a rever seus compromissos voluntários. Se isso ocorrer, será mais um capítulo da disputa entre a visão soberanista defendida por parte do Congresso e a lógica de mercado global, cada vez mais atrelada a critérios socioambientais.






























